A cantoria da bicharada

O sapinho-pingo-de-ouro (Brachycephalus ephippium) mede apenas 12 milímetros e solta a sua voz sob as folhas do chão (fotos: Célio Haddad).

“Sapo-cururu na beira do rio. Quando sapo canta, diz que está com frio…”. Essa música é antiga à beça e fala do canto dos sapos. E você? Já escutou o som desses bichos? Pois nem é preciso ir à mata para ouvir: pesquisadores da Universidade Estadual Paulista lançaram um guia, composto por um livreto e um CD com 80 sons de 70 espécies de sapos, rãs e pererecas que vivem na Mata Atlântica.

A perereca-verde ( Aplastodiscus leucopygius) adora cantar perto do rio, em terrenos alagados ou em pequenas poças de água.

Durante 25 anos, o professor Célio Haddad, coordenador do projeto que criou o guia, viajou por várias regiões, como Ubatuba e Ribeirão Branco, em São Paulo, além de estados como Espírito Santo, Santa Catarina e Bahia, gravando, em fitas cassetes, diferentes sons desses anfíbios. O resultado de tantos anos de pesquisa foi uma coleção contendo 500 gravações. A idéia de transformar os registros sonoros em CD foi do aluno João Gabriel Giovanelli, que passou para o computador todas as antigas gravações, selecionando algumas. “Com isso, além de preservar a qualidade do som por mais tempo, podemos facilitar o acesso à coleção”, afirma o estudante de ecologia.

O sapo-ferreiro ( Hypsiboas faber) emite seus sons sobre a vegetação baixa que existe próximo a poças temporárias ou permanentes.

Segundo João, de acordo com a situação, uma mesma espécie de sapo, rã ou perereca emite diferentes sons. Para atrair a fêmea, por exemplo, o macho emite o som de anúncio. Já para disputar a fêmea com outro macho, solta o som de briga. O terceiro tipo é chamado canto de namoro e o ouvimos no momento do acasalamento. Vários machos se juntam perto do rio, mostrando todo o seu talento, e a fêmea escolhe o que tem melhor canto para ser o seu parceiro. “Nesse momento, os sons de anúncio e de briga se misturam”, ressalta o pesquisador. Existe ainda o som de agonia, que é emitido quando o anfíbio é atacado por outro animal.

A perereca-castanhola macho ( Itapotihyla langsdorffii ) atrai a fêmea às margens dos córregos de águas calmas no interior das matas e restingas .

Para fazer o CD, uma equipe identificou todas essas situações, selecionando, para cada espécie que aparece no guia, sons de anúncio, de briga e de agonia. Além disso, o encarte do CD traz informações sobre as espécies, os locais onde foram encontradas, além de belíssimas fotos.

Segundo os organizadores, o estudo do canto dos sapos, das rãs e das pererecas brasileiras revela curiosidades sobre o seu comportamento que geralmente não são fornecidos por trabalhos escritos, pois, neles, o canto é representado por gráficos. “Por mais detalhadas que sejam as descrições, elas jamais vão nos dar a sensação que temos ao ouvir os cantos de fato”, diz o prof. Célio Haddad.

Os machos da espécie Myrsiella microps , conhecida como rãzinha-assobiadora-da-mata, cantam para chamar a atenção das fêmeas geralmente longe da água.

Enquanto em outros países, como Estados Unidos, Inglaterra e Argentina, coleções sonoras de animais são muito comuns, no Brasil, esse guia é quase uma novidade entre os pesquisadores e pode ajudar muita gente. “Esperamos atingir tanto o público em geral que se interessa pela nossa fauna quanto estudantes e pesquisadores da vida animal, estimulando a observação deles na natureza e auxiliando em pesquisas de campo”, afirma Haddad. Então, o que você acha de ficar com os ouvidos grudados nos sons dos sapos e de olho no guia para identificá-los?

Guia Sonoro dos Anfíbios Anuros da Mata Atlântica
Pedidos pelo e-mail jgiovanelli@gmail.com ou
na livraria Conceito ( www.livrariaconceito.com.br ).
Preço: R$ 15.