A ciência de Marie Curie

Até o século 19, fazer pesquisa não era tarefa para mulheres. Em muitos países, elas sequer podiam estudar em uma universidade. Foi em uma época assim que viveu Marie Curie, a primeira mulher a dar aulas em um curso superior na França e a ganhar o Nobel, um dos prêmios mais importantes do mundo, dado anualmente aos cientistas que mais se destacaram.

Marya Sklodowska, que mais tarde ficou conhecida como Marie Curie, nasceu em Varsóvia, na Polônia, em 7 de novembro de 1867.

Desde menina, Marya suportou duras provas. Quando tinha nove anos, sua irmã mais velha morreu. Dois anos depois, foi a vez de sua mãe. Além disso, a região onde morava estava dominada pelos russos, que impunham leis severas aos poloneses. Seu pai perdeu o emprego e a família teve que viver em condições precárias.

Marie Curie foi a primeira mulher a ganhar um prêmio Nobel (foto: Wikimedia Commons).

Aos 16 anos, acabou o ginásio com medalha de ouro. Mas, naquele tempo, na Polônia, não era permitido que as mulheres fossem para a universidade. Por isso, ela e sua irmã Bronia decidiram estudar na França e fizeram um trato: Bronia iria estudar medicina em Paris, enquanto Marya ficaria na Polônia trabalhando como governanta para ajudar a irmã. Depois, quando Bronia se formasse, seria a vez de Marya viajar.

Em setembro de 1981, já com 23 anos, ela finalmente realizou seu sonho: inscreveu-se na Faculdade de Ciências na Universidade de Paris, mais conhecida como Sorbonne. Foi nessa ocasião que trocou seu nome para Marie.

Passou três anos morando em quartos mal aquecidos no inverno, economizando cada tostão e estudando intensamente. No final de seus estudos universitários em física, em 1893, ela tirou o primeiro lugar. Nas férias, voltou à Polônia, onde ganhou uma bolsa que lhe permitiu estudar matemática, curso que terminou em segundo lugar.


No início daquele ano, Marie conheceu o físico francês Pierre Curie. Ele tinha 35 anos e já havia feito importantes descobertas científicas. A amizade foi longe: casaram-se em 26 de julho de 1895.

Logo depois do nascimento de sua primeira filha, Irene, em 1897, Marie decidiu estudar um fenômeno descoberto pouco antes pelo físico francês Henri Becquerel. Ele colocou sais de um elemento químico chamado urânio sobre uma placa sensível protegida por uma folha de alumínio e manteve esse dispositivo na escuridão. Com tal experimento, observou que a imagem desse sal ficava impressa na placa. Deduziu, então, que os sais de urânio emitiam uma radiação (como os raios do sol) que não podia ser vista facilmente, a qual deu o nome raios urânicos.

Pierre e Marie Curie (foto: Museu do Laboratório Curie, Instituto do Rádio).

 

Em 12 de abril de 1898, alguns resultados obtidos por Marie foram apresentados à Academia de Ciências, um órgão na França onde se reúnem os melhores cientistas. Esses resultados eram tão empolgantes que Pierre abandonou sua pesquisa para ajudar no trabalho de sua mulher. Juntos, passavam horas tentando isolar o elemento químico descoberto por Marie. Eles observaram que, na verdade, eram dois elementos, aos quais chamaram polônio (em homenagem à Polônia) e rádio. O polônio era 300 vezes mais radioativo que o urânio e o rádio, um milhão de vezes.

Não confunda o rádio em que a gente escuta música com o elemento químico descoberto por Marie e Pierre. O rádio de música emite sinais radiofônicos que não fazem mal a ninguém.

A descoberta do rádio fez com que ela, juntamente com Pierre, ficasse famosa. Mas foi um trabalho duro, principalmente para Marie, que se dedicou muitas horas até conseguir, em 1902, um material mais puro e, então, determinar suas propriedades químicas e físicas. Toda essa pesquisa foi feita em um galpão mal protegido do calor do verão e do frio e da chuva do inverno.

Já a partir de 1900, os pesquisadores observaram que a radioatividade atinge o corpo humano. Para tentar entender melhor esses efeitos, Pierre colocou um pouco de rádio em seu próprio braço. A pele ficou vermelha e depois virou uma ferida. Becquerel também fez testes em seu corpo e mostrou que o rádio não provocava efeitos quando estava envolvido em outro metal, o chumbo. Mas, naquela época, não se sabia que se expor ao rádio durante muito tempo podia até matar e ninguém se preocupava em se proteger. Os Curie não se deram conta de que os dedos doloridos, a fraqueza e as fortes dores no corpo, que atingiam principalmente Pierre, eram causadas pelo rádio.

Em 1903, o rádio começou a ser testado para tratar duas doenças: o câncer e o lupo. Nesse mesmo ano, o Prêmio Nobel de Física foi dado a Becquerel e ao casal Curie pelas pesquisas sobre a radioatividade. Foi a primeira vez que uma mulher o ganhou.

Em 1904, Pierre foi nomeado professor de física na Faculdade de Ciências da Sorbonne. Nesse mesmo ano, nasceu a segunda filha do casal, Ève. Dois anos depois, Marie enfrentou uma nova prova: Pierre morreu em um acidente, atropelado por um caminhão. Com a morte do marido, Marie ocupou o seu cargo de professor, sendo, assim, a primeira mulher a ensinar em uma universidade francesa.

Juntamente com o francês André Debierne, Marie obteve o rádio em estado puro, em 1910. No ano seguinte, ganhou, mais uma vez, o Prêmio Nobel de Química. A partir dessa data, dedicou-se a conseguir dinheiro para construir um centro de pesquisas da radioatividade e de seu uso no tratamento de doenças. O Instituto do Rádio (hoje, Instituto Curie) ficou pronto, no início da primeira guerra mundial, em 1914.


A partir de 1920, começou a sentir os efeitos das radiações às quais permaneceu exposta durante cerca de duas décadas. Os estragos nas suas mãos impressionavam os que a visitavam, mas ela continuou trabalhando até quase o fim da vida. Em 4 de julho de 1934, morreu de leucemia, provavelmente causada pelas radiações. Seus cadernos de laboratório permanecem radioativos até hoje. Em 1995, os restos mortais de Marie foram colocados no Pantheon, um lugar onde ficam os grandes homens mortos. Mesmo sem ela ser francesa… Foi, mais uma vez, a primeira mulher a receber essa homenagem

Lucía Tosi
Laboratório de Físico-Química Biomolecular e Celular
Universidade Pierre e Marie Curie
(Texto publicado originalmente na CHC 56)