A árvore sagrada da Amazônia

A mitologia indígena brasileira é repleta de figuras ligadas à força da natureza. Tupã seria o deus do trovão, criador do céu, da terra e das águas. Jaci seria a deusa Lua, mãe dos vegetais. Guaraci, o deus Sol, seria o guardião do dia. E a samaúma, conhece? Ela é a árvore sagrada da Amazônia para os povos indígenas da região. Mas por quê?

Foto Renilson Silva/Wikimedia Commons

A samaúma é uma das maiores árvores do Brasil, com cerca de 60 metros de altura e troncos com dois metros de diâmetro. Os cientistas a batizaram de Ceiba pentandra, mas, popularmente, também é chamada de samaumeira, árvore da vida ou escada do céu. Para os indígenas da região amazônica, ela é a “mãe-das-árvores”.

Segundo a mitologia indígena, assim como as mães costumam sempre olhar por suas crias, a samaúma, por sua grandiosidade, “enxerga” toda a floresta por cima. Ainda por essa tradição, na base da árvore existe um portal invisível aos olhos humanos que liga o nosso universo ao universo dos seres divinos, que protegem a floresta e os animais, como um “espírito materno”.

Típica das matas de várzea da Amazônia que ocupam o Brasil, Equador, Venezuela e Colômbia, a samaúma ocorre naturalmente também no México e no sul da América Central. Há ainda registros em países da África e Ásia.

Grande e frágil

Apesar da sua grandeza, a samaúma apresenta fragilidades. Uma delas, talvez a principal, diz respeito à sua reprodução. Veja: a samaúma leva muito tempo para dar flor – cerca de sete anos – e suas flores formam um cacho que dura somente uma noite! Essas flores são visitadas por morcegos, que, ao se alimentarem de néctar, levam grãos de pólen presos em seus pelos. Ao visitarem outras flores de samaúmas, eles podem deixar esse pólen dentro delas, fecundando-as, isto é, fazendo com que se forme um fruto.

Os frutos da samaúma medem cerca de 10 centímetros de comprimento e servem de alimento para alguns animais da floresta, que, após a digestão, liberam as sementes em suas fezes, possibilitando que uma nova planta venha a germinar.

Cada fruto da samaúma contém, aproximadamente, de 120 a 170 sementes, que são envolvidas por uma espécie de pluma, conhecida como kapok, que é utilizada como enchimento de travesseiros, colchões, boias, salva-vidas e até como isolante térmico.

As flores da samaúma duram apenas uma noite.
Foto Dinesh Valke/Wikimedia Commons
O kapok envolve as sementes da samaúma.
Foto Leyo/Wikimedia Commons

Usos e risco

A samaúma tem propriedades medicinais. Sua seiva, por exemplo, é usada para tratar conjuntivite. Já o chá de suas cascas é empregado no tratamento da malária, doença transmitida pela picada de um mosquito.

Das sementes do fruto da samaúma, é extraído um óleo comestível que também pode ser usado como combustível para lamparinas, fabricação de sabão e lubrificantes.

A madeira desta enorme árvore gigantesca é utilizada na fabricação de jangadas, caixotes, palito de fósforo, brinquedos e celulose. Há quase 50 anos, é também explorada para a produção de compensado, um tipo de madeira do qual se faz móveis, embalagens e utensílios. É o excesso de exploração da samaúma para esta finalidade que coloca a espécie em risco de extinção.

 

 

Caixa d’água natural

Quando estamos com sede, tomamos água no bebedouro ou nos servimos de água do filtro ou da geladeira de casa, não é mesmo? Já parou para pensar no tratamento que essa água que chega às nossas casas recebe? Por conta da poluição dos rios e fontes que abastecem as cidades, a água precisa passar por várias etapas de tratamento até ser considerada apropriada para consumo.

Na floresta, as raízes em forma de tábuas da samaúma, que se espalham ao redor de seu tronco, são verdadeiros reservatórios de água limpa. Pode-se beber daquela água ou preparar alimentos com ela sem qualquer preocupação.

Tambor de samaúma

A samaúma tem raízes tabulares (em forma de tábua) chamadas sapopemas. Elas cercam o tronco das árvores e servem como abrigos para diversos animais. As sapopemas podem medir de 80 a 160 centímetros de diâmetro. Ao bater nelas, o som ecoa e pode ser ouvido a longas distâncias na floresta. Os indígenas costumam se comunicar uns com os outros por meio dessas batidas.

Foto Marco Schmidt/Wikimedia Commons
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Tambor de samaúma

A samaúma tem raízes tabulares (em forma de tábua) chamadas sapopemas. Elas cercam o tronco das árvores e servem como abrigos para diversos animais. As sapopemas podem medir de 80 a 160 centímetros de diâmetro. Ao bater nelas, o som ecoa e pode ser ouvido a longas distâncias na floresta. Os indígenas costumam se comunicar uns com os outros por meio dessas batidas.

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Foto Marco Schmidt/Wikimedia Commons

BAOBÁ

Foto Marco Schmidt/Wikimedia Commons

Outras árvores sagradas

Em outras culturas também há árvores sagradas. A Yggdrasil é uma árvore que, segundo a mitologia nórdica, abriga os noves reinos, entre eles Asgard, o reino de Odin – senhor da cura, da vida e da morte – e Midgard, o reino dos humanos.

Na África, temos o baobá, considerado árvore sagrada no Senegal, onde é fonte de inspiração para muitas lendas. Os baobás – acredite! – podem viver até seis mil anos e conseguem armazenar até 120 mil litros de água no interior de seus troncos.

Conhecer um pouquinho sobre a samaúma nos faz pensar que, além de proteger nossas florestas, devemos conhecer e respeitar diferentes culturas, buscando entender seus hábitos, costumes e também descobrir as origens de suas lendas.

Aníbal da Silva Cantalice
Universidade Federal do Piauí

Marcela Eringe Mafort
Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais

Jean Carlos Miranda
Universidade Federal Fluminense

Matéria publicada em 17.09.2020

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