A realeza desfila pelas ruas de uma pequena cidade do interior. Rei, rainha, príncipes e princesas e outros integrantes da nobreza passam pelo meio do público. Eles são protegidos por uma guarda composta por homens negros vestidos com roupas brancas, ostentando fitas coloridas cruzadas nos peitos, chapéus, lenços e outros adereços. Os guardas seguem as ordens dos capitães, cuja função é manter a ordem no desfile. Tambores, pandeiros, violas, cantos e passos coreografados também fazem parte do evento.
A cena descrita não se refere a um desfile da realeza verdadeira, mas a uma festividade chamada ‘congada’ou reinado. Já ouviu falar?A congada é uma tradição iniciada pelos africanos escravizados que vieram forçados para o Brasil muito tempo atrás. Pelos registros históricos, começou no Recife, no século 17. Depois, ganhou outros estados. Chegou a Minas Gerais entre os séculos 18 e 19, e se tornou uma importante celebração neste estado que registrou o maior número de escravizados do Brasil.
As festas de congadas existem até hoje. Trata-se de uma tradição mantida pelos descendentes dos africanos escravizados, levados para trabalhar nas chamadas terras do ouro, como eram conhecidas algumas regiões de Minas Gerais.
Era assim, festejando, que os escravizados conseguiam expressar seus sentimentos: falar da saudade da África, reclamar dos maus tratos que sofriam, colocar para fora as suas dores. Mas
nem toda memória precisa ser triste. Criar uma festa, uma manifestação, pode ser entendido como uma forma de não esquecer uma história e recontá-la de maneira a manter uma memória viva para as novas gerações.
Na cidade mineira de Piedade do Rio Grande, as festas de congadas acontecem no último fim de semana do mês de maio. Em outras cidades do estado – como Ibertioga, Santana do Garambéu, São João del Rei, Tiradentes e Rio das Mortes– também se realizam os festejos nos meses de janeiro, maio e outubro.
A festa da congada é como uma encenação que representaa realeza do Congo,reino africano de onde foram trazidos muitosescravizados para o Brasil. Na verdade, a festa retrata, mais especificamente, a coroação do rei do Congo. E de Congo… veio o termo congada!
Mas a festa pode também representar a coroação da rainha de Angola, outro país africano de onde foram trazidos muitos escravizados para o Brasil. Isso porque, acredita-se que as primeiras manifestações de coroação dos reis congos teriam sido realizadas com os reis do atual território de Angola, no século 16.
A congada soma à tradição africana da coroação do rei congo elementos da religião católica, que dominava o Brasil na época da escravidão e continua muito presente em nosso país (leia mais em Fé na Congada). Por isso, a manifestação destaca a imagem de Nossa Senhora do Rosário.
Reza a lenda que a figura da santa apareceu no mar, mas não aceitou ser retirada pelos homens brancos que escravizavam os homens negros. Ela preferiu seguir com os negros e
estes, então, acharam que a santa tinha vindo para abençoá-los e protegê-los. Por isso, passaram a homenageá-la. Essa mistura de recordações das raízes e fé é a marca das congadas no Brasil, especialmente em Minas Gerais.
Na maior parte das escolas brasileiras, o período da escravidão é estudado somente por meio de relatos e imagens dos escravizados sendo castigados e tratados como se não fossem humanos. Quando estudamos também o que herdamos da cultura africana e os papéis de mulheres e homens negros na História do Brasil, descobrimos um outro lado da História.
As festas de congadas e outras manifestações culturais – como maracatu, jongo, bumba-meu-boi, capoeira, caboclinho, samba de rodas – fazem parte do que somos. São expressões populares que podem ser sentidas, ouvidas e vividas de forma positiva nos dias atuais e que devem continuar sendo passadas de geração em geração.
A congada não é só uma festa, dança ou teatralização da corte. Ela representa também a devoção do povo.Ao anoitecer, os participantes fazem suas oferendas a São Benedito, Nossa Senhora das Mercês, Nossa Senhora do Rosárioe outros santos e divindades. O povo que festeja a congada une elementos das religiões de origem africana e afro-brasileiras ao catolicismo. Os alimentos ofertados simbolizam um vínculo entre o povo e as forças espirituais e, em conjunto, com as danças e cantos tornam a festa completa.
Lívia Nascimento Monteiro
Grupo de Estudo e Pesquisa Cultura Negra no Atlântico
Departamento de História
Universidade Federal Fluminense
Matéria publicada em 22.08.2018
Anna Elise
Gostei muito de saber sobre a congada!Antes de ler esse texto não imaginava nem o que era essa dança ,agora, já sei várias coisas sobre a congada!
Camila Lara de Oliveira
EU gostei muito deste texto . Gostei de saber sobre a congada e outras festas populares . Gastei um folego para ler esse texto infinito . Mas foi bom ler pois nao sabia o que era congada .
BEM um beijo e tchau
Mallu Libânio de Moraes
Adorei saber sobre a congada! Parábens CHC!