A chamada população caiçara é aquela que vive entre a mata e o mar, com uma cultura ligada à natureza. Esses povos tradicionais brasileiros ocupam parte das regiões costeiras dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina. Mas, ao longo do tempo, as mudanças que ocorreram na sociedade, especialmente as transformações no meio ambiente e na economia, vêm interferindo na cultura deles – em sua vestimenta, religião,
música e alimentação.
A mandioca sempre foi o alimento mais comum no prato dos caiçaras – além disso, plantar, colher e vender esse vegetal se tornou uma fonte de renda das comunidades. A atividade agrícola também incluía frutos e outras raízes, como inhame, cará e batata-doce. Os produtos de origem animal vinham da caça ou da criação, especialmente de galinhas e porcos. A pesca, realizada em períodos específicos do ano, contava com uma divisão de tarefas: os homens pescavam e as mulheres manipulavam o pescado (limpeza, defumação e salga).
Esses costumes dos povos caiçaras, porém, passaram a sofrer mudanças no século passado. Um dos motivos foi a ocupação do litoral por casas de veraneio e hotéis, reduzindo muito as terras dessas comunidades. Outro motivo foi a criação de áreas de proteção ambiental sem levar em conta a forma como essas comunidades se relacionam com a natureza. De uma hora para outra, os costumes caiçaras foram considerados inadequados, e, com isso, essas comunidades perderam ainda mais espaço.
Expulsas de seus locais de origem, muitos migraram para os centros urbanos. Logo, as atividades realizadas foram parcial ou totalmente interrompidas, o que acarretou mudanças profundas na vida dos caiçaras, inclusive na alimentação.
Os saberes e tradições transmitidos oralmente das gerações antigas para as mais novas, incluindo a culinária e tudo o que ela envolve (plantar, colher, pescar, caçar e preparar os alimentos), foram se perdendo. Mas as comunidades caiçaras se deram conta disso e começaram a se organizar para resgatar seus costumes, sua arte e suas tradições culinárias. O esforço se deu para recriar no presente o modo de vida do passado, reforçando o sentimento de ser caiçara, mesmo vivenciando uma nova realidade.
Valorizar a alimentação foi um caminho que eles encontraram para entender seu modo de vida, quem eles são e de onde eles vieram. Por isso, que tal visitar uma vila caiçara, conversar com o povo local e comer uma comida típica na próxima vez que você for ao litoral? Você estará contribuindo para que essa rica cultura ligada ao mar não se perca.
Tássia Biazon
Cátedra UNESCO para Sustentabilidade do Oceano
Universidade de São Paulo
Guilherme Marques e Alexander Turra
Instituto Oceanográfico
Universidade de São Paulo
Matéria publicada em 10.11.2022