Ciência Hoje das Crianças: Conservadores e restauradores de obras de arte também são artistas?
Daniel Aguiar: Não necessariamente! Apesar de, em vários casos, ser desejável que conservadores-restauradores tenham habilidades técnicas parecidas com as de um artista, não se exige que eles tenham a mesma capacidade criativa.
CHC: Qual é o maior inimigo de uma obra de arte?
Daniel: Que pergunta difícil! Para responder, precisamos saber qual tipo de obra estamos estudando, onde essa obra está, de que materiais é feita etc. Existe uma área da conservação-restauração que lida justamente com essa avaliação de riscos. Não é uma tarefa simples… Por exemplo, os riscos para esculturas de bronze são diferentes no litoral e no interior do Brasil. O mesmo vale para objetos de mármore, se estão expostos ao ar livre ou dentro de um museu. Mas a maior ameaça mesmo a uma obra de arte é o desconhecimento de quem trabalha com ela.
CHC: Por que é importante restaurar uma obra de arte?
Daniel: Muita gente acredita que uma obra de arte deva ser restaurada para que ela fique “novinha em folha”, e isso não é verdade. Costumo dizer aos meus alunos que uma obra deve ser restaurada para que ela volte a funcionar como uma obra de arte. É que, quando uma obra está muito degradada, pode ser difícil, ou até impossível, entender o que o artista quis expressar. Aí o conservador-restaurador deve avaliar com muito cuidado qualquer tipo de intervenção.
CHC: O que é preciso para ser um conservador-restaurador ou uma conservadora-restauradora?
Daniel: Hoje há cursos de graduação em muitas universidades, e também é possível fazer um curso técnico. É necessário, ainda, entender a importância e a responsabilidade de cuidar do patrimônio cultural do nosso povo.
CHC: Como o Brasil valoriza e cuida do seu acervo de arte?
Daniel: Poxa, essa é uma pergunta triste de ser respondida. De maneira geral, o Brasil não valoriza seu patrimônio cultural tanto quanto deveria. Embora não seja um museu exclusivamente dedicado à arte, o incêndio do Museu Nacional diz muito a esse respeito.
CHC: Quando as obras são muito antigas, e não existem fotos de como elas eram antes, como o restaurador faz?
Daniel: É preciso que antes seja feita uma pesquisa completa da origem da obra, do artista que a criou, dos seus aspectos históricos, dos materiais utilizados na criação, do seu significado para uma determinada comunidade etc. Depois, uma equipe de conservadores-restauradores define a melhor abordagem, sempre respeitando a ideia do artista. No caso de obras muito antigas e que faltem algumas partes, a equipe pode, inclusive, decidir não “preencher” aquelas lacunas.
CHC: E se um restaurador errar ao trabalhar com uma obra de arte?
Daniel: As decisões são quase sempre tomadas em equipe, o que diminui muito a chance de erro. Mas um dos pilares da restauração é justamente poder “desfazer” qualquer intervenção, se for necessário. Então aí é importante que o profissional conheça bem os materiais que serão usados e toda a química envolvida no envelhecimento deles. Sim, os materiais da restauração também vão envelhecer!
CHC: E onde a química entra nessa história?
Daniel: Ela está presente em um monte de processos em conservação e restauração. Ela ajuda na identificação dos materiais usados pelo artista, ajuda a investigar falsificações de obras de arte e ainda ajuda na produção de materiais mais eficientes e seguros para restauração, como é o caso dos géis na limpeza de pinturas. Os químicos trabalham muito para produzir novos materiais que atendam as expectativas dos conservadores-restauradores.
CHC: Qual foi o trabalho mais legal que você já fez?
Daniel: Lá no laboratório que coordeno estou em dois projetos que valem a pena comentar. Em um deles, tentamos desenvolver formas para que os vernizes das pinturas não fiquem amarelados rapidamente. No outro, usamos a química para criar novas substâncias que evitem a degradação do bronze com o tempo. A química é linda, não é mesmo?