“Bom, dia! Aqui é o seu repórter aéreo do Sistema Solar, com as condições do trânsito nesta manhã de segunda-feira. Pistas livres em direção à Lua, porém o motorista que segue em direção ao Sol perde muito tempo: o trânsito de Vênus está complicado por conta da colisão entre um ônibus espacial e um disco voador”.
Por mais esquisito que possa parecer, a expressão “trânsito de Vênus”, que apareceu aqui e ali nos jornais e TVs no início deste mês, não tem nada a ver com engarrafamentos de naves espaciais no nosso planeta vizinho. “Trânsito”, neste caso, tem a ver com um planeta passar pela frente do Sol, um fenômeno astronômico que acontece de tempos em tempos. No caso de Vênus não acontece com muita frequência: a próxima vez será apenas em 2117, daqui a mais de um século! Não é à toa, portanto, que muitos astrônomos estavam tão empolgados.
Daqui da Terra podemos observar apenas dois planetas “transitarem” na frente do Sol: Mercúrio e Vênus. Por isso, desde muito antigamente já se sabia que as órbitas dos dois planetas estavam entre a órbita da Terra e o Sol. Mesmo nas representações antigas do Sistema Solar, em que a Terra era imaginada no centro e o Sol e os outros planetas é que giravam em torno dela, pode-se observar que Vênus e Mercúrio giravam em torno da Terra em círculos menores do que o círculo percorrido pelo Sol – o que permitiria que, em algumas ocasiões, estes planetas pudessem ser vistos passando na frente do Sol.
Como Mercúrio percorre sua órbita mais rapidamente do que Vênus, trânsitos de Mercúrio ocorrem com mais frequência do que trânsitos de Vênus. No entanto, como Mercúrio é muito menor do que Vênus e está muito mais perto do Sol (e mais distante de nós), ele aparece apenas como um pontinho quase imperceptível contra o disco do Sol. Já Vênus, que é quase do mesmo tamanho que a Terra e está bem mais perto de nós, aparece como um pequeno disco que cruza o círculo iluminado do Sol, num show muito mais bonito, ainda que curto: o trânsito dura pouco mais de 6 horas.
Para observar esse espetáculo, não se deve olhar diretamente para o Sol, pois isso causaria um dano muito sério ao olho. O que os astrônomos fazem normalmente é projetar uma imagem do Sol e observar o disco escuro de Vênus atravessar de um lado a outro o disco brilhante do Sol. Esse tipo de observação foi muito importante no passado para ajudar a determinar a distância entre a Terra e o Sol, com grande exatidão.
Eu já acho muito bacana morar num ponto do Sistema Solar de onde se pode avistar dois planetas transitarem na frente do Sol. Agora imagine como deve ser poder observar de Urano o trânsito de Júpiter ou de Saturno, ou ver de Marte o trânsito da Terra! Será que de lá daria pra ver as luzes dos nossos carros parados no trânsito engarrafado?