Era fevereiro, não me recordo o ano, véspera do carnaval. Na rua se ouvia ao longe: plac, plac, plac… Um bloco de sujos se aproximava e o barulho aumentava. Naquela época, os blocos de carnaval eram formados por dez ou vinte pessoas que se reuniam e, com latas transformadas em instrumentos de batuque, saíam pelas ruas.
![Nos blocos de sujos do passado, roupa velha, latas e muita sujeira eram sempre garantia de muita alegria. (foto: Arquivo Público do Estado de São Paulo)](http://chc.org.br/wp-content/uploads/2014/02/carnaval-de-rua.jpg)
Nos blocos de sujos do passado, roupa velha, latas e muita sujeira eram sempre garantia de muita alegria. (foto: Arquivo Público do Estado de São Paulo)
Alguns poucos se fantasiavam de palhaços, marinheiros e bailarinas. Porém, a maioria tinha roupas velhas e rasgadas, por vezes manchadas de barro, e que assim lhe davam o nome de bloco de sujos.
Sujos ou não, a alegria era garantida. Para não serem reconhecidos, os participantes tinham as caras cobertas com máscaras ou mesmo velhas fronhas furadas no lugar dos olhos e da boca – um detalhe que gerava muita desconfiança, diga-se de passagem. Mas não tenho nenhuma dúvida de que todos gostavam de participar ou mesmo de vê-los desfilar.
O disfarce é um meio de realizarmos ações ou de podermos nos beneficiar, sem que outros nos reconheçam. Na natureza, isso também acontece, desde os tempos pré-históricos.
Várias plantas e animais que viveram há milhões de anos desenvolveram mecanismos para serem mais bem sucedidos no ambiente em que viviam. Falsos espinhos, chifres gigantescos, plumagens exuberantes, formatos variados e talvez até mesmo cores inimagináveis serviam como estratégias para a sobrevivência e para possibilitar vantagens sobre outras espécies.
![Este é <i>Hallucigenia</i>, cujo fóssil foi encontrado em rochas do período Cambriano. Pernas para o alto ou para baixo? Ninguém sabe exatamente como era sua posição em vida. (imagem: Adaptado de Wikimedia Commons / Scorpion451 / <a href=http://creativecommons.org/licenses/by-sa/2.5/deed.en>CC BY-SA 2.5</a>)](http://chc.org.br/wp-content/uploads/2014/02/hallucigenia1-600x429.jpg)
Este é Hallucigenia, cujo fóssil foi encontrado em rochas do período Cambriano. Pernas para o alto ou para baixo? Ninguém sabe exatamente como era sua posição em vida. (imagem: Adaptado de Wikimedia Commons / Scorpion451 / CC BY-SA 2.5)
Um exemplo curioso é um pequeno invertebrado chamado Hallucigenia, que viveu há 500 milhões de anos no Canadá. Ele possuía um conjunto de possíveis pernas e espinhos, que os paleontólogos não conseguem descobrir se ficavam dispostos para cima ou para baixo. Seu nome remete a esta birutice: o bicho é tão esquisito que parece uma alucinação!
Outros animais também tinham estratégias curiosas, como o inseto Hallucinochrysa, encontrado no interior de um âmbar com mais de 110 milhões de anos. Ele usava restos de plantas e animais mortos para se disfarçar – um verdadeiro mestre das fantasias.
![Os Triceratops tinham chifres e adornos na cabeça. Uma fantasia poderosa, e somente os possuidores de chifres vistosos eram os mais bem sucedidos. (ilustração: Charles R. Knight)](http://chc.org.br/wp-content/uploads/2014/02/triceratops.jpg)
Os Triceratops tinham chifres e adornos na cabeça. Uma fantasia poderosa, e somente os possuidores de chifres vistosos eram os mais bem sucedidos. (ilustração: Charles R. Knight)
Essas estratégias não aparecem apenas nos pequenos invertebrados, mas também em grandes animais. Os dinossauros Triceratops provavelmente usavam seus chifres e adornos no crânio como forma de atrair suas fêmeas ou para o combate com outros machos.
![Muitos dinossauros também andavam “disfarçados” por aí. A fantasia desta espécie emplumada certamente fazia sucesso. (ilustração: Matt Martyniuk / Wikimedia Commons / <a href=http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0/deed.en>CC BY-SA 3.0</a>)](http://chc.org.br/wp-content/uploads/2014/02/dinossauro-emplumado-600x366.jpg)
Muitos dinossauros também andavam “disfarçados” por aí. A fantasia desta espécie emplumada certamente fazia sucesso. (ilustração: Matt Martyniuk / Wikimedia Commons / CC BY-SA 3.0)
Sem falar que muitos outros dinossauros, com suas plumas de formas e cores variadas, fariam sucesso até hoje em qualquer desfile de carnaval!
No decorrer de milhões de anos, as estratégias de sobrevivência levaram a soluções cada vez mais elaboradas na forma e estrutura das plantas e dos animais. Como nas escolas de samba, se a fantasia não é boa e se o samba atravessa, o destino dos seres vivos é encerrarem suas carreiras de sambistas e desaparecerem para sempre da passarela da evolução da vida na Terra.
Anna Elise
Amei o texto!
Publicado em 3 de novembro de 2018