O cheirinho que vinha da cozinha ocupava todos os cômodos da casa e se espalhava pelo jardim, alcançando até a esquina da rua onde jogávamos pião. Não que eu fosse um exímio lançador de piões, mas sempre insistia em melhorar minhas jogadas. Porém, naquele final de tarde, com a fome avançando, o aroma que vinha da cozinha de minha casa era estonteante e me distraía. Era dia de camarão!
Evento raro, já que morávamos a pelo menos duas centenas de quilômetros da praia mais próxima. Porém, vez por outra, aparecia alguém com um singelo saquinho com camarões, e fazíamos a festa. Podiam ser cozidos, assados e até mesmo ensopados com chuchu – nesse último caso, só um cheiro de camarão, o que abundava mesmo era o chuchu. Mas meu camarão favorito era o frito: especialmente com aquela casquinha crocante!
Os camarões são artrópodes e, como os outros animais desse grupo, possuem uma ‘casca’ que nada mais é do que um esqueleto externo. Formado por uma substância chamada quitina, a estrutura, muito resistente, ajuda a proteger os órgãos internos do animal e é também uma boa proteção externa contra predadores. A resistência dos esqueletos externos dos artrópodes é tão grande que, muitas vezes, eles resistem ao tempo e podem se tornar fósseis.
Camarões pertencem à ordem Decapoda e podem existir tanto em ambientes de água salgada quanto de água doce. Em sua cabeça, existem longos pares de antenas, que funcionam como sensores para explorar o ambiente. É na cabeça também que se encontra o coração desses animais – que louco, não acha? Quase sempre, os camarões têm ainda olhos grandes que possibilitam ter uma boa percepção do ambiente em que vivem.
Ao longo do tempo geológico, temos vários registros de fósseis de camarão. O mais antigo, conhecido como Aciculopoda, possui aproximadamente 360 milhões de anos. No Brasil, são bastante comuns em rochas com 100 milhões de anos, do período Cretáceo. Por vezes, esses registros guardam detalhes delicados do corpo dos animais – essa é uma pista de que aquele corpo não foi decomposto pela ação de bactérias, e que a fossilização aconteceu de maneira bem rápida.
A transformação do organismo morto em um registro fóssil, petrificado, é por vezes um processo lento, que implica em modificações químicas e físicas durante meses. Mas, em certas situações, com o brusco soterramento e a atuação de microrganismos, a formação do fóssil pode ser muito rápida.
Bem, talvez não tão rápida quanto a velocidade em que corri, quando minha mãe gritou: “Olha o jantar!” Como um predador voraz, não sobrou nem a casca dos camarões, que poderiam, quem sabe um dia, também contar um pouco de sua história.