Penas, para que te quero?

Ele era engraçado e atrevido. A qualquer desaforo, respondia à altura. Se ficava zangado, não pensava duas vezes e atacava o agressor. Porém, bastava um cafuné na cabeça que logo se derretia. Assim era Loro, o papagaio verde de minha avó Dedé. Bastava ele nos ver que logo nos chamava pelo nome – e olha que não éramos poucos os que circulavam pela casa!

O vaidoso Loro, galante com sua plumagem verde, atraía a atenção de todos, inclusive das papagaias. (foto: Pixabay.com / Domínio Público)

O vaidoso Loro, galante com sua plumagem verde, atraía a atenção de todos, inclusive das papagaias. (foto: Pixabay.com / Domínio Público)

Loro era capaz tanto de repetir palavras e frases, como também conseguia manter pequenas conversas: “OaOaoa….Aqui é o Looorooo. Looooorooo dá o pé. Faz cafuné!”, dizia ele, para o assombro de todos. Porém, sua maior relação era com vó Dedé, a quem ele sempre a chamava: “vem Dedé, vem cá Dedé!”

O papagaio tinha penas verdes, com plumas amareladas e avermelhadas. Quando suas penas caíam, eram o objeto de desejo de todos, pois davam marcadores de livro incríveis.

Pena fóssil com 100 milhões de anos encontrada na Bacia do Araripe, no estado do Ceará. (foto: Ismar de Souza Carvalho).

Pena fóssil com 100 milhões de anos encontrada na Bacia do Araripe, no estado do Ceará. (foto: Ismar de Souza Carvalho).

Aliás, não só em Loro, mas em todas as aves, as penas são a característica que mais atrai nossa atenção. Longas ou curtas, enrijecidas ou plumosas, são sempre de cores variadas e vibrantes, com muitas finalidades. Dependendo da forma das penas, elas podem servir para voar, para proteger contra o frio ou até mesmo para atrair um parceiro na época do acasalamento.

Mas você, que sabe que esta coluna fala sobre pré-história, deve estar se perguntando: será que as penas podem ser preservadas como fósseis?

Fóssil de ave – (i)Cratoavis cearensis(/i) – em que se preservaram os ossos, juntamente com as penas, por mais de 100 milhões de anos. Além da longa pena da cauda, todo seu corpo possui penas de diferentes tipos. (foto: Ismar de Souza Carvalho)

Fóssil de ave – (i)Cratoavis cearensis(/i) – em que se preservaram os ossos, juntamente com as penas, por mais de 100 milhões de anos. Além da longa pena da cauda, todo seu corpo possui penas de diferentes tipos. (foto: Ismar de Souza Carvalho)

Sim! Apesar de ser difícil encontrar uma ave fóssil completa, as penas são encontradas preservadas em rochas que possuem, às vezes, milhões de anos. Algumas das mais famosas vêm do Nordeste do Brasil, precisamente do estado do Ceará.

Em rochas da bacia sedimentar do Araripe, com idade de 100 milhões de anos, existem tanto fósseis de aves quanto de penas isoladas. A preservação desses fósseis permite, em alguns casos, ver até os antigos padrões de cores, o que é uma verdadeira raridade.

Esta é a reconstituição de (i)Cratoavis(/i). Veja como deve ter sido uma ave colorida e exuberante! (ilustração: Deverson Pepi)

Esta é a reconstituição de (i)Cratoavis(/i). Veja como deve ter sido uma ave colorida e exuberante! (ilustração: Deverson Pepi)

Agora, atenção: nem todo fóssil de penas isoladas veio de aves! Muitos dinossauros também tiveram seus corpos recobertos por plumagem. Eram os dinoaves, nem dinossauro, nem aves, mas um grupo fóssil que foi bastante abundante na era Mesozoica (aproximadamente entre 250 e 65 milhões de anos atrás).

Gosto de pensar que Loro adoraria conhecê-los – infelizmente, ele fugiu antes de eu me tornar um cientista, voando atrás de uma papagaia charmosa que apareceu no alto de uma mangueira.