Muito mais do que isca

Nova espécie de minhoca encontrada às margens do rio Verde, em Itaberá/SP (foto: Samuel James).

Hoje é dia de fazer uma viagem subterrânea! Vamos conhecer um dos mais importantes e incompreendidos animais da natureza: a minhoca. Mas pode guardar a vara de pescar, porque esse bicho é muito mais do que um simples ajudante na caça aos peixes.

A minhoca contribui de várias maneiras para melhorar as propriedades do solo. Para começar, os buracos que ela faz na terra ajudam a arejá-la e permitem que a água circule melhor por ali. Além disso, o seu cocô é cheio de nutrientes que enriquecem o solo. Tudo isso é bom para as plantas, que retiram da terra a água e os nutrientes que precisam para crescer.

A presença de minhocas em um solo, porém, não garante, necessariamente, a sua qualidade. “As minhocas contribuem para a melhoria da terra, mas não são tão eficientes quanto um fertilizante, por exemplo”, explica George Brown, agrônomo da Empresa Brasileira de Agropecuária (Embrapa). Tanto é que existem minhocas na Amazônia, apesar de ser comprovado que o solo de lá, em geral, é pobre.

O pesquisador Marcos Garcia, da Embrapa, segura uma minhoca gigante da Amazônia, da espécie Rhinodrilus priolli (foto: Jörg Römbke).

Mas não é só na Amazônia que existem minhocas. Elas ocupam grande parte do território nacional e em quantidade. O Brasil é o terceiro país com maior número de minhocas do mundo. São cerca de 300 espécies já conhecidas espalhadas por aí. Porém, como são poucos os especialistas que as estudam, a expectativa é que existam muito mais espécies. Pelos cálculos de George, cerca de mil.

Ele e sua equipe encontraram 45 novas espécies em poucos meses de busca. Uma delas, do gênero Rhinodrilus , com impressionantes 60 centímetros, chamou a atenção pelas cores, uma mistura de azul com cinza. O que os anima nessa procura é o fato de que muitas minhocas só existem nas proximidades do local onde foram encontradas, ou seja, são endêmicas. “Por isso, é muito provável que se achem novas espécies em lugares nunca antes visitados”, explica.

Pesca, uma ameaça
Porém, enquanto não achamos novas espécies, temos que proteger as que já conhecemos. Você lembra do início do texto quando falamos sobre pesca? Pareceu brincadeira, né? Pois saiba que a pesca é um risco para esses bichos subterrâneos. Isso porque os pescadores descobriram que muitos peixes têm preferência por um tipo especial de minhoca de tamanho grande, os chamados minhocuçus.

Dessa forma, muitos minhocuçus – como o minhocuçu-do-cerrado ( Rhinodrilus alatus ), que pode medir mais de 50 centímetros –, são caçados e utilizados como isca. Como conseqüência, essa espécie está na lista de animais ameaçados de extinção. Para tentar mudar essa situação, George propõe algumas soluções, como a coleta limitada e a utilização de iscas artificiais ou de minhocas criadas em cativeiro, como a gigante africana ou a vermelha da Califórnia. “Porém, a tarefa é complicada, já que nem todos os peixes gostam delas”.

Vários minhocuçus são expostos para venda em Foz do Iguaçu, no Paraná. A venda de minhocas para a pesca é uma ameaça para diversas espécies (foto: Samuel James).

Por falar em isca, sabia que muitos pescadores cortam as minhocas em vários pedaços para render mais? Tudo porque a maioria das minhocas pode regenerar grande parte do corpo. Mas há um detalhe: o animal não resiste se for cortado na altura dos seus órgãos principais, como o coração. Eles ficam perto da cabeça do animal, que por sua vez fica próxima de uma parte mais gorda da minhoca, o clitelo, seu órgão reprodutor.
Essa característica permite às minhocas resistir aos ataques de aves, que muitas vezes cortam esses bichos pela metade com o bico. Mas também serve para mostrar como são curiosos esses animais que vivem embaixo da terra. Você não acha?