O caso do mercúrio

Não é só em filmes de ficção: vira e mexe, a história tem detalhes obscuros e mistérios que ninguém conseguiu desvendar. Um deles envolve a morte, em 1601, do astrônomo dinamarquês Tycho Brahe, que ficou famoso por suas descobertas sobre a posição dos astros no céu.

Tycho Brahe (1546-1601) foi um astrônomo dinamarquês que fez contribuições importantes para entender o movimento dos astros. Sua morte esteve envolta em mistério e controvérsia (Imagem: Edward Ender / Wikimedia Commons)

Tycho Brahe (1546-1601) foi um astrônomo dinamarquês que fez contribuições importantes para entender o movimento dos astros. Sua morte esteve envolta em mistério e controvérsia (Imagem: Edward Ender / Wikimedia Commons)

Se, para alguns, Tycho havia morrido por causa de um problema na bexiga, para outros era certo que a causa da morte tinha sido envenenamento por mercúrio. Intrigados com essa dúvida tão antiga, cientistas decidiram realizar análises dos restos mortais do astrônomo para tentar solucioná-la de vez.

Documentos da época em que Tycho faleceu diziam que, onze dias antes de morrer, ele havia participado de um banquete real e, depois, apresentado problemas na bexiga. Essa era a versão oficial dos fatos até 1901, quando pesquisadores dinamarqueses analisaram o túmulo do cientista e, em um fio de cabelo que ainda apresentava raiz, encontraram altos níveis de mercúrio, uma substância muito tóxica.

Passaram, então, a acreditar que o envenenamento teria sido a causa da morte de Tycho. Logo surgiram hipóteses sobre um assassinato, e Johannes Kepler, seu discípulo, tornou-se o principal suspeito – seu objetivo seria roubar os cálculos de Tycho para fazer seus próprios estudos.

Mercúrio não foi
Mais de um século depois, a hipótese foi finalmente descartada. Em um novo estudo dos restos mortais de Tycho, cientistas da Universidade de Copenhague analisaram a barba do astrônomo, além de seus ossos e restos de roupas.

Pesquisadores analisaram as concentrações de mercúrio nos ossos e na barba do astrônomo Tycho Brahe e descartaram a hipótese de ele ter morrido intoxicado por esse metal (Foto: Universidade de Copenhague)

Pesquisadores analisaram as concentrações de mercúrio nos ossos e na barba do astrônomo Tycho Brahe e descartaram a hipótese de ele ter morrido intoxicado por esse metal (Foto: Universidade de Copenhague)

Embora tenham encontrado mercúrio, os pesquisadores afirmam que a substância estava em quantidades bem abaixo do limite do que seria perigoso para a saúde. Eles concluíram também que Tycho não teve nenhum contato com o metal nos seus últimos dias de vida nem nos 15 anos que os precederam.

“Tycho era poeta, médico, astrônomo e envolvido com alquimia, logo era esperado que ele tivesse algum contato com mercúrio, que na época era usado para tudo”, diz o antropólogo forense Niels Lynnerup. “Mas mostramos que, com certeza, ele não foi envenenado com mercúrio nem morreu intoxicado por essa substância”.

Por outro lado, as roupas com as quais Tycho foi enterrado estavam encharcadas com o metal. Niels explica: era comum usar mercúrio para embalsamar corpos – por isso, a amostra analisada em 1901 deve ter sido contaminada.

Se, por um lado, já temos certeza de que Tycho Brahe não morreu envenenado por mercúrio, por outro, ainda não sabemos a causa certa de sua morte. Niels acredita que os problemas na bexiga sejam a hipótese mais provável. Se ele está certo? Talvez nunca tenhamos certeza…