O homem que foi levado pelo boto

Ilustração: Marcello Araújo

Esta história aconteceu há muitos anos no município de Tapauá, no Amazonas. Era uma tarde de verão como outra qualquer, em que os amigos se encontravam para pescar, como de costume, na beira do rio. Como sempre acontecia, eles pegavam suas canoas, caniço e iscas, se dividiam e cada um ia para um igapó. Depois se encontravam novamente para as trocas de peixe. Quem, por exemplo, havia pescado muito tucunaré trocava com outro que pegou bastante jaraqui.

Às seis horas, todos se reencontraram, mas, nesse dia, faltava um. Esse era chamado de Biriba. Todos ficaram muito preocupados porque o Biriba não apareceu. Muitos saíram à sua procura. A cidade inteira se mobilizou, mas anoiteceu, amanheceu e ele não apareceu. Vários dias de busca se passaram e nada de o encontrarem: nem a canoa, nem o corpo e nem um sinal de que ele esteve no rio naquele dia.

Depois de uns dias, a família, conformada, resolveu celebrar a missa de sétimo dia, pois ele era muito querido e talvez fosse essa a única homenagem que poderiam prestar a ele.

Ilustração: Denis José Pinheiro Ribeiro

Todos já o conheciam por “finado Biriba”. Passou-se o tempo e, na missa de um mês, quando estavam reunidos em frente à igreja para a celebração, surgiu ao longe, no meio do rio, um homem em sua canoa, muito magro, fazendo força para remar. As pessoas olhavam boquiabertas e pareciam não acreditar no que seus olhos lhe mostravam. Realmente não poderia ser. Era ele depois de exatamente um mês: o finado Biriba, que agora não era finado. Havia aparecido no meio do rio, vivo! Bastante magro, muito abatido, mas estava vivo!

Assim que ele colocou os pés em terra, desmaiou. Foi levado ao hospital, foi medicado porque estava muito fraco e bastante atordoado, e não falava coisa com coisa. Dizia que os botos iam se vingar e o médico sempre dizia: “ele está delirando, pois está muito fraco!”

Quando ele saiu do hospital e todo aquele tormento passou, Biriba contou que fora levado pelos botos, e, no fundo do rio, existia uma cidade enorme, que era habitada por botos e sereias. Por sorte, ele havia conseguido fugir, mas lá havia muitas pessoas – adultos, jovens e crianças – que tinham sido sequestradas por eles.

Ele dizia que já estava marcado, e não tinha mais jeito: a única saída era não se aproximar do rio nunca mais. E assim seguiu a vida longe do rio, das pescas, das festas. Depois de muito tempo passado, ele foi ao flutuante em uma festa do outro lado do rio. Neste dia estava um sol escaldante, o calor era insuportável, e o Biriba decidiu dar apenas um mergulho, naquele rio que lhe fazia tanta falta.

Foi seu último mergulho. As buscas foram feitas, a cidade mais uma vez se mobilizou, mas, desta vez, nunca mais ele voltou.

História contada pela professora aposentada Maria das Dores Abreu dos Santos, de 51 anos, e publicada no livro Universo mítico da Amazônia – Resgatando a arte de contar histórias.