Em meio a campos inundáveis, matas às margens dos rios e diversas lagoas de água salobra (mistura de água doce e salgada), o Pantanal apresenta formações monodominantes, que são paisagens nas quais mais da metade das plantas é de um único tipo. O principal motivo para que isso aconteça é que o Pantanal é um bioma em que são frequentes dois tipos de situações: queimadas, que acontecem naturalmente ou pela ação do ser humano, e enchentes.
O vai e vem de água e fogo cria um ambiente no qual os animais, fungos e plantas precisam estar bem adaptados tanto para sobreviver às chamas quanto para suportar as chuvas e os alagamentos. Para isso, alguns animais conseguem subir em árvores, outros se escondem em tocas, há os que nadam muito bem e os que correm rápido, além daqueles que sabem quando vai vir um período difícil e simplesmente migram para outras regiões.
No caso das plantas, como elas não têm pernas para sair correndo das queimadas ou da cheia, precisam encontrar meios de sobreviver. Algumas desenvolveram troncos com cascas grossas, que funcionam como um traje antifogo; outras têm grandes raízes e caules que ficam embaixo da terra, permitindo que a planta renasça depois de uma queimada ou de uma cheia; há plantas que até passaram a usar as chamas e águas em seu benefício, fazendo delas um sinal que diz às sementes que é hora de brotar; e há também as espécies que permanecem como sementes por anos no solo, germinando após um fogo forte ou uma grande inundação.
Agora dá para imaginar que algumas plantas estão mais preparadas do que outras para sobreviver a todo esse fogo e inundação. E, ao longo do tempo, as plantas que estão mais bem adaptadas vão sobrevivendo, produzindo sementes e aumentando sua população em áreas onde gostam de ficar. Vá somando esse crescimento da população de um tipo de planta com a diminuição das outras e… pronto! Depois de vários anos desse molha e queima, teremos um bosque natural, com predomínio de um só tipo de planta! Que tal conhecer alguns deles?
São formados por ipês-amarelos, conhecidos na região como “paratudo”, porque a casca da árvore é utilizada como remédio para várias doenças – tosse, diarreia, febre… Essa mesma casca também é resistente ao fogo, e é comum ficar marcada por uma fuligem, que pode durar meses após as chamas. Também resistem bem à inundação quando adultas. São árvores altas, podendo chegar a mais de 20 metros de altura! Na época da floração, todas as folhas caem, dando lugar a flores amarelas e resultando numa paisagem que se destaca ao longe.
Formados por ipês-roxos ou “piúvas”, que é como os pantaneiros os chamam. São árvores grandes e com troncos grossos, mas diferentes dos seus primos paratudos, não só pelas flores, que têm cores rosadas, como também pelas folhas, um pouco menores. As piúvas são também utilizadas como remédio, mas são menos populares que o paratudo.
São formados pela canjiqueira! Apesar do nome, a planta não tem nada a ver com a canjica, comida típica das festas juninas. Trata-se de uma espécie de arbusto grande, parente da acerola. Seus frutos são comestíveis, de cor amarela e surgem no verão. Podem ser usados para a produção de sucos e picolés – uma delícia! As canjiqueiras são plantas que resistem bem ao fogo por terem caules e raízes que ficam espalhados embaixo da terra, armazenando nutrientes e energia. Após a passagem do fogo, quando o tronco e as folhas são queimados, esses sistemas subterrâneos entram em ação e fazem brotar um novo tronco. Dessa forma, a planta sobrevive muito bem às queimadas constantes da região.
São formados por carandás, um tipo de palmeira que embeleza as paisagens pantaneiras. Como todas as palmeiras, essas plantas não têm troncos, de modo que não formam uma casca grossa capaz de protegê-las do fogo. Os carandás também não apresentam sistemas subterrâneos e, para complicar ainda mais, cresce, em meio às suas folhas, um palmito, que, quando danificado, acaba provocando a morte da planta. Para se defender do fogo, contam com as bainhas, que são aquela base da folha que fica presa ao caule, mesmo quando a folha está morta. Essas bainhas formam uma espécie de armadura natural, bem parecida com escamas, que protegem o caule da palmeira, enquanto folhas grossas e em formato de leque no topo mantêm o palmito a salvo das chamas.
Paratudais, piuvais, canjiqueirais e carandazais são apenas algumas das várias paisagens que o Pantanal oferece. Além delas, temos pimenteirais, cambarazais, pateirais, arrozais… a lista é imensa! Algumas são resistentes apenas à inundação, outras, ao fogo, e outras ainda, à combinação dos dois. E tudo isso se apresenta como resultado de um ambiente que aprendeu não só a conviver com o fogo e as águas, como também a fazer destes elementos uma estratégia para continuarem a viver com saúde e harmonia.
Admirar o Pantanal não é apenas se encantar com as belezas que vemos, mas também compreender os diversos ciclos naturais que, ainda que pareçam destrutivos, mantêm o equilíbrio da natureza.
Pedro Isaac Vanderlei de Souza
Programa de Pós-graduação em Biologia Vegetal
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
Geraldo Alves Damasceno Junior
Paulo Robson de Souza
Instituto de Biociências
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
Matéria publicada em 01.10.2024
Kobe Douglas Sampaio Messias
Olá CHC! Sou Kobe Douglas,gostei de saber que no pantanal tem matas com só uma espêcie de planta.Até mais